PCP exige um programa de emergência para a<br> Democracia Cultural
O Programa do Governo PS para a área da Cultura é um dos casos em que Programa de Governo e Programa Eleitoral são praticamente idênticos.
Repete-se deste modo no Programa do Governo o que já era negativo no Programa Eleitoral: para além de algumas opiniões críticas em relação às políticas do Governo PSD/PP, nomeadamente no plano orçamental, e umas linhas gerais de orientação, a incapacidade de atribuir à cultura a prioridade e a centralidade que deve assumir, e de reconhecer que a situação existente é claramente de crise e exige um conjunto de medidas excepcionais.
Passados 100 dias sobre a tomada de posse do Governo, e na ausência de sinais positivos, há matérias que importa clarificar politicamente quanto antes: a questão do financiamento público, e a avaliação da crise a que o sector da cultura, nas suas diferentes componentes, foi conduzido pelas políticas de direita.
Quanto à questão do financiamento o Programa de Governo repetiu um compromisso muitíssimo insatisfatório que o Programa Eleitoral já continha: sendo de há muito um dado aceite (inclusive por personalidades responsáveis no PS) que o orçamento para a área da Cultura deveria tender a aproximar-se do 1% do PIB, o que o Programa de Governo aponta é para uma meta de 1% do Orçamento de Estado, a alcançar «a médio prazo».
A diferença entre uma coisa e outra pode ser ilustrada com números fornecidos pelo anterior governo do PS: em 2000, o orçamento da Cultura representava 0,6% da despesa da Administração Central, e 0,2% do PIB. Isto é: entre um compromisso e o outro, a diferença é de 1 para 3.
Tratava-se de um mau indício. Mas as drásticas medidas de “contenção orçamental” que o Governo entretanto pôs em marcha, invertendo o sentido de compromissos eleitorais assumidos, vieram agravar, em muito, as más perspectivas para que esse indício apontava. Por este lado, não só não se vê como pretenderá o Governo libertar o sector da cultura da «asfixia financeira em que três anos de governação à direita o colocaram», (como reconhecia, e bem), como é de prever um acentuado agravamento.
Não poderá ser, certamente, prosseguindo a orientação que governos anteriores, do PS ou da direita, puseram em prática: a de pressionar uma participação crescente dos municípios – cada ano mais sacrificados – no financiamento público das actividades culturais, para compensar o cada vez mais insuficiente financiamento oriundo da administração central. Entre 1999 e 2002 a despesa da administração central no financiamento das actividades culturais cresceu 45,6% (de 209,8 para 305,6 milhões de euros) e a das Câmaras Municipais cresceu 48% (de 517,6 para 766,1 milhões de euros, incluindo o financiamento de actividades e equipamentos desportivos, que representa uma parcela inferior a 8% destes totais). Esta política onera particularmente os municípios das zonas do interior e do sul, enquanto as despesas da administração central se concentram em equipamentos e áreas já em situação relativamente favorável. O investimento per capita em actividades culturais num município do Alentejo ou da Beira Interior Norte é praticamente o dobro do de um município de Lisboa.
Quanto à crise instalada no sector da cultura, ela vai muito para além do subfinanciamento, atinge praticamente todas as áreas e instituições e, mais uma vez, existem orientações no Programa de Governo que apontam em sentido contrário ao da sua superação. Não existe hoje nenhuma área do sector da cultura que não atravesse uma situação de preocupante crise, seja na área dos museus como na dos arquivos, na do património móvel ou imóvel como na do cinema e audiovisual, na dos teatros como nas orquestras, seja nas relações transversais com as áreas do ensino ou da comunicação social. Instituições da maior importância, como por exemplo o IPA ou Centro Português de Fotografia, encontram-se em situação aflitiva. O próprio Ministério da Cultura, nomeadamente na forma como estão organizados e funcionam os seus Institutos, é mais parte do problema do que das soluções. Não cabendo nesta posição abordar todas estas situações, referem-se apenas algumas a que se atribui particular gravidade e significado.
Um exemplo flagrante diz respeito ao que se passa com os museus: é certo que os governos PSD/PP reduziram o seu orçamento a níveis de indigência. Mas os problemas a resolver de imediato vão muito para além do financiamento e, de entre eles, destaca-se a questão do pessoal necessário, adequadamente qualificado e ao qual sejam asseguradas condições de estabilidade, progressão e dedicação, nos diferentes níveis do funcionamento e das actividades museológicas. O Programa de Governo no sector da Cultura nada diz sobre esta matéria, e, no geral, aponta para o seu agravamento, nomeadamente na proposta de manter apenas um lugar por cada dois actuais nos quadros da Administração Pública. O funcionamento regular, a investigação e a dinamização em muitas das instituições culturais é basicamente incompatível com políticas de precarização e de corte cego de custos com pessoal. E também não terá qualquer resolução num absurdo quadro de «voluntariado» (sic). Uma política cultural consistente só pode assentar em elevados níveis de qualificação, especialização, e profissionalização.
Outro exemplo flagrante é transversal: trata-se da articulação entre as políticas culturais e as políticas de Educação e Ensino. O Programa de Governo nada diz acerca da Reforma do Ensino Secundário actualmente em curso, e aceita as alterações no Ensino Superior decorrentes da aplicação do processo de Bolonha. Em ambos os casos existem graves implicações no plano cultural. A concretizarem-se as lógicas que presidem a estes processos, o sistema de ensino vedará à esmagadora maioria das crianças e dos jovens o acesso e a familiarização com os universos da cultura e da arte, reservados, na prática, como áreas equivalentes às tecnológicas e vocacionais no Ensino Secundário e de especialização no Ensino Superior. As consequências culturais de tais orientações num país com gravíssimos problemas de iliteracia são enormes. Milhares e milhares de jovens poderão fazer praticamente todo o seu percurso escolar sem nunca ter contacto com a literatura, ou a poesia, ou qualquer das outras formas de expressão artística, para não se mencionar o caso da música, há anos arredada dos curricula escolares normais. Neste quadro, que política de formação de públicos pode ser empreendida, se ela não pode ter qualquer eficácia se for a contracorrente dos outros processos de formação? É de um autêntico processo de exclusão cultural que se pode tratar: de exclusão não do acesso, mas da própria vontade de ter acesso à criação e à fruição cultural e artística. Acentuando a prioridade à superação do défice tecnológico existente (o que corresponde a uma realidade), o Governo ignora a importância do défice e do atraso culturais, cujas repercussões são e serão muitíssimo mais gravosas.
E aqui o que importa clarificar em relação ao Programa de Governo e às suas perspectivas de actuação é uma clara divergência política e ideológica na abordagem das questões da cultura. Para o Governo, e para a linha de continuidade das políticas de direita que adopta, as questões da área cultural colocam-se, na melhor das hipóteses, no plano da modernização e, em período de crise, serão das primeiras a ser sacrificadas. Para o PCP, elas colocam-se no plano da emancipação individual e colectiva e do desenvolvimento da sociedade portuguesa e constituem, portanto, uma prioridade que não pode ser abandonada. A política cultural necessária não é separável de uma verdadeira política de saída da crise, e terá que ter a democratização cultural como eixo central. Democratização no acesso à fruição, democratização no acesso à criação. Uma decidida e clara prioridade orçamental e política, e uma responsabilização determinante do Estado. Uma política de profissionalização, e um largo apelo a uma participação militante na aventura cultural. E, no imediato, um autêntico programa de emergência para a área cultural.
Um programa de emergência para a democracia cultural deve nascer de um reconhecimento político expresso da situação a que se chegou e da identificação rigorosa dos grandes eixos estratégicos para a ultrapassar.
A política de cultura deve ser definida com a participação efectiva do mundo da cultura. Um tal programa deve ser participado pelas associações e grupos que actuam nos vários sectores de actividade e os podem representar.
Um programa que entenda a necessidade da qualificação e profissionalização dos artistas e demais agentes culturais, tem de reconhecer as especificidades do trabalho intermitente, negociar um estatuto socioprofissional e um regime fiscal adequados, e elaborar, a breve prazo, os instrumentos legais correspondentes. O PCP apresentará, em breve, um conjunto de iniciativas legislativas nesse âmbito.
O natural crescimento das indústrias culturais tem podido gerar uma relativa massificação no acesso a produtos, geralmente sem qualidade, rodeando pequenas bolsas elitárias. No respeito pela diversidade das opções estéticas e pela controvérsia científica, uma política democrática e de esquerda deve compreender que a democratização não de reduz à massificação, antes implica a garantia do acesso à diversidade formal e estética, a formação de públicos e a generalização do ensino artístico, procurando também por estas vias alterar a própria estrutura social desses públicos.
Compreendendo a cultura artística nos seus nexos com a educação e ensino, assim como com a cultura científica, tecnológica e ambiental, torna-se necessário perceber que a cultura em sentido amplo designa um conjunto de processos através dos quais as sociedades humanas se formam e transformam; assim como é urgente encontrar as formas de interacção e coordenação das diferentes medidas, o que implica que seja iniciada, desde já, a reconsideração das reformas de carácter retrógrado, com repercussão no empobrecimento da formação cultural dos jovens, introduzidas no sistema de ensino pelo Governo PSD/PP.
Um programa de emergência para a democratização deve assumir o crescimento de forma sustentada, e não a restrição e os cortes cegos, do orçamento para as várias esferas da cultura e, no caso, para a cultura artística. O facto de sucessivos governos terem repetidamente anunciado e falhado este objectivo é a prova real de uma efectiva incapacidade das forças políticas, que se têm revezado no governo, compreenderem o que se joga de decisivo nestas áreas. O Orçamento Geral do Estado para 2006 será, nesse aspecto, definitivamente clarificador.
A democratização da cultura e o desenvolvimento cultural constituem indissociavelmente factor e efeito do enraizamento e ampliação da democracia política, de um desenvolvimento económico e social sustentado, assim como o trabalho, a aquisição de destrezas, de faculdades criativas e críticas são condições indispensáveis para a emancipação individual e social e o progresso do nosso país.
A saída da crise exige um amplo e profundo sobressalto nacional, uma radical inversão nas políticas que sucessivos governos vêm seguindo. Portugal não está condenado ao atraso. O que está condenado, e deve ser quanto antes interrompido, é o rumo e a orientação políticas que conduziram a esta situação, grave no plano nacional, grave no plano da cultura.
O PCP lança um veemente apelo ao mundo da cultura, aos criadores, a todos os trabalhadores e agentes culturais, a que, qualquer que seja a área em que actuem, participem no processo de mudança que a vida tornou urgente. Essa participação, indispensável, será não apenas um importante contributo para a mudança, mas o reassumir, para a cultura, do papel essencial que lhe cabe na construção do futuro.
Comissão Nacional do PCP para a Área da Cultura
Repete-se deste modo no Programa do Governo o que já era negativo no Programa Eleitoral: para além de algumas opiniões críticas em relação às políticas do Governo PSD/PP, nomeadamente no plano orçamental, e umas linhas gerais de orientação, a incapacidade de atribuir à cultura a prioridade e a centralidade que deve assumir, e de reconhecer que a situação existente é claramente de crise e exige um conjunto de medidas excepcionais.
Passados 100 dias sobre a tomada de posse do Governo, e na ausência de sinais positivos, há matérias que importa clarificar politicamente quanto antes: a questão do financiamento público, e a avaliação da crise a que o sector da cultura, nas suas diferentes componentes, foi conduzido pelas políticas de direita.
Quanto à questão do financiamento o Programa de Governo repetiu um compromisso muitíssimo insatisfatório que o Programa Eleitoral já continha: sendo de há muito um dado aceite (inclusive por personalidades responsáveis no PS) que o orçamento para a área da Cultura deveria tender a aproximar-se do 1% do PIB, o que o Programa de Governo aponta é para uma meta de 1% do Orçamento de Estado, a alcançar «a médio prazo».
A diferença entre uma coisa e outra pode ser ilustrada com números fornecidos pelo anterior governo do PS: em 2000, o orçamento da Cultura representava 0,6% da despesa da Administração Central, e 0,2% do PIB. Isto é: entre um compromisso e o outro, a diferença é de 1 para 3.
Tratava-se de um mau indício. Mas as drásticas medidas de “contenção orçamental” que o Governo entretanto pôs em marcha, invertendo o sentido de compromissos eleitorais assumidos, vieram agravar, em muito, as más perspectivas para que esse indício apontava. Por este lado, não só não se vê como pretenderá o Governo libertar o sector da cultura da «asfixia financeira em que três anos de governação à direita o colocaram», (como reconhecia, e bem), como é de prever um acentuado agravamento.
Não poderá ser, certamente, prosseguindo a orientação que governos anteriores, do PS ou da direita, puseram em prática: a de pressionar uma participação crescente dos municípios – cada ano mais sacrificados – no financiamento público das actividades culturais, para compensar o cada vez mais insuficiente financiamento oriundo da administração central. Entre 1999 e 2002 a despesa da administração central no financiamento das actividades culturais cresceu 45,6% (de 209,8 para 305,6 milhões de euros) e a das Câmaras Municipais cresceu 48% (de 517,6 para 766,1 milhões de euros, incluindo o financiamento de actividades e equipamentos desportivos, que representa uma parcela inferior a 8% destes totais). Esta política onera particularmente os municípios das zonas do interior e do sul, enquanto as despesas da administração central se concentram em equipamentos e áreas já em situação relativamente favorável. O investimento per capita em actividades culturais num município do Alentejo ou da Beira Interior Norte é praticamente o dobro do de um município de Lisboa.
Quanto à crise instalada no sector da cultura, ela vai muito para além do subfinanciamento, atinge praticamente todas as áreas e instituições e, mais uma vez, existem orientações no Programa de Governo que apontam em sentido contrário ao da sua superação. Não existe hoje nenhuma área do sector da cultura que não atravesse uma situação de preocupante crise, seja na área dos museus como na dos arquivos, na do património móvel ou imóvel como na do cinema e audiovisual, na dos teatros como nas orquestras, seja nas relações transversais com as áreas do ensino ou da comunicação social. Instituições da maior importância, como por exemplo o IPA ou Centro Português de Fotografia, encontram-se em situação aflitiva. O próprio Ministério da Cultura, nomeadamente na forma como estão organizados e funcionam os seus Institutos, é mais parte do problema do que das soluções. Não cabendo nesta posição abordar todas estas situações, referem-se apenas algumas a que se atribui particular gravidade e significado.
Um exemplo flagrante diz respeito ao que se passa com os museus: é certo que os governos PSD/PP reduziram o seu orçamento a níveis de indigência. Mas os problemas a resolver de imediato vão muito para além do financiamento e, de entre eles, destaca-se a questão do pessoal necessário, adequadamente qualificado e ao qual sejam asseguradas condições de estabilidade, progressão e dedicação, nos diferentes níveis do funcionamento e das actividades museológicas. O Programa de Governo no sector da Cultura nada diz sobre esta matéria, e, no geral, aponta para o seu agravamento, nomeadamente na proposta de manter apenas um lugar por cada dois actuais nos quadros da Administração Pública. O funcionamento regular, a investigação e a dinamização em muitas das instituições culturais é basicamente incompatível com políticas de precarização e de corte cego de custos com pessoal. E também não terá qualquer resolução num absurdo quadro de «voluntariado» (sic). Uma política cultural consistente só pode assentar em elevados níveis de qualificação, especialização, e profissionalização.
Outro exemplo flagrante é transversal: trata-se da articulação entre as políticas culturais e as políticas de Educação e Ensino. O Programa de Governo nada diz acerca da Reforma do Ensino Secundário actualmente em curso, e aceita as alterações no Ensino Superior decorrentes da aplicação do processo de Bolonha. Em ambos os casos existem graves implicações no plano cultural. A concretizarem-se as lógicas que presidem a estes processos, o sistema de ensino vedará à esmagadora maioria das crianças e dos jovens o acesso e a familiarização com os universos da cultura e da arte, reservados, na prática, como áreas equivalentes às tecnológicas e vocacionais no Ensino Secundário e de especialização no Ensino Superior. As consequências culturais de tais orientações num país com gravíssimos problemas de iliteracia são enormes. Milhares e milhares de jovens poderão fazer praticamente todo o seu percurso escolar sem nunca ter contacto com a literatura, ou a poesia, ou qualquer das outras formas de expressão artística, para não se mencionar o caso da música, há anos arredada dos curricula escolares normais. Neste quadro, que política de formação de públicos pode ser empreendida, se ela não pode ter qualquer eficácia se for a contracorrente dos outros processos de formação? É de um autêntico processo de exclusão cultural que se pode tratar: de exclusão não do acesso, mas da própria vontade de ter acesso à criação e à fruição cultural e artística. Acentuando a prioridade à superação do défice tecnológico existente (o que corresponde a uma realidade), o Governo ignora a importância do défice e do atraso culturais, cujas repercussões são e serão muitíssimo mais gravosas.
E aqui o que importa clarificar em relação ao Programa de Governo e às suas perspectivas de actuação é uma clara divergência política e ideológica na abordagem das questões da cultura. Para o Governo, e para a linha de continuidade das políticas de direita que adopta, as questões da área cultural colocam-se, na melhor das hipóteses, no plano da modernização e, em período de crise, serão das primeiras a ser sacrificadas. Para o PCP, elas colocam-se no plano da emancipação individual e colectiva e do desenvolvimento da sociedade portuguesa e constituem, portanto, uma prioridade que não pode ser abandonada. A política cultural necessária não é separável de uma verdadeira política de saída da crise, e terá que ter a democratização cultural como eixo central. Democratização no acesso à fruição, democratização no acesso à criação. Uma decidida e clara prioridade orçamental e política, e uma responsabilização determinante do Estado. Uma política de profissionalização, e um largo apelo a uma participação militante na aventura cultural. E, no imediato, um autêntico programa de emergência para a área cultural.
Um programa de emergência para a democracia cultural deve nascer de um reconhecimento político expresso da situação a que se chegou e da identificação rigorosa dos grandes eixos estratégicos para a ultrapassar.
A política de cultura deve ser definida com a participação efectiva do mundo da cultura. Um tal programa deve ser participado pelas associações e grupos que actuam nos vários sectores de actividade e os podem representar.
Um programa que entenda a necessidade da qualificação e profissionalização dos artistas e demais agentes culturais, tem de reconhecer as especificidades do trabalho intermitente, negociar um estatuto socioprofissional e um regime fiscal adequados, e elaborar, a breve prazo, os instrumentos legais correspondentes. O PCP apresentará, em breve, um conjunto de iniciativas legislativas nesse âmbito.
O natural crescimento das indústrias culturais tem podido gerar uma relativa massificação no acesso a produtos, geralmente sem qualidade, rodeando pequenas bolsas elitárias. No respeito pela diversidade das opções estéticas e pela controvérsia científica, uma política democrática e de esquerda deve compreender que a democratização não de reduz à massificação, antes implica a garantia do acesso à diversidade formal e estética, a formação de públicos e a generalização do ensino artístico, procurando também por estas vias alterar a própria estrutura social desses públicos.
Compreendendo a cultura artística nos seus nexos com a educação e ensino, assim como com a cultura científica, tecnológica e ambiental, torna-se necessário perceber que a cultura em sentido amplo designa um conjunto de processos através dos quais as sociedades humanas se formam e transformam; assim como é urgente encontrar as formas de interacção e coordenação das diferentes medidas, o que implica que seja iniciada, desde já, a reconsideração das reformas de carácter retrógrado, com repercussão no empobrecimento da formação cultural dos jovens, introduzidas no sistema de ensino pelo Governo PSD/PP.
Um programa de emergência para a democratização deve assumir o crescimento de forma sustentada, e não a restrição e os cortes cegos, do orçamento para as várias esferas da cultura e, no caso, para a cultura artística. O facto de sucessivos governos terem repetidamente anunciado e falhado este objectivo é a prova real de uma efectiva incapacidade das forças políticas, que se têm revezado no governo, compreenderem o que se joga de decisivo nestas áreas. O Orçamento Geral do Estado para 2006 será, nesse aspecto, definitivamente clarificador.
A democratização da cultura e o desenvolvimento cultural constituem indissociavelmente factor e efeito do enraizamento e ampliação da democracia política, de um desenvolvimento económico e social sustentado, assim como o trabalho, a aquisição de destrezas, de faculdades criativas e críticas são condições indispensáveis para a emancipação individual e social e o progresso do nosso país.
A saída da crise exige um amplo e profundo sobressalto nacional, uma radical inversão nas políticas que sucessivos governos vêm seguindo. Portugal não está condenado ao atraso. O que está condenado, e deve ser quanto antes interrompido, é o rumo e a orientação políticas que conduziram a esta situação, grave no plano nacional, grave no plano da cultura.
O PCP lança um veemente apelo ao mundo da cultura, aos criadores, a todos os trabalhadores e agentes culturais, a que, qualquer que seja a área em que actuem, participem no processo de mudança que a vida tornou urgente. Essa participação, indispensável, será não apenas um importante contributo para a mudança, mas o reassumir, para a cultura, do papel essencial que lhe cabe na construção do futuro.
Comissão Nacional do PCP para a Área da Cultura